Se opor é perigoso! Por Erika Melo - PORTAL DO ÁGUIA

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18 março 2018

Se opor é perigoso! Por Erika Melo

O Sociólogo brasileiro Antônio Cândido, ao estudar os impactos do subdesenvolvimento na arte da América Latina e ao desnudar as influências políticas que envolvem a atrofia intelectual de alguns, disse que uma das saídas para o quadro seria o que chamou de “causalidade interna”, que é quando os mais novos sobem nos ombros dos anteriores, podendo ir mais além que estes ou, mesmo, quando um absorve os pontos positivos do outro, na maioria das vezes, por meio das críticas construtivas.


Dizemos isso, pois essa observação de Cândido é muito significativa para se entender as querelas da política brasileira, especialmente, no caso de cidades como a de Parnaíba, no estado do Piauí. No fundo da crise política há, na verdade, uma crise identitária, porque adiamos para apenas agora resolver erros políticos já existentes por muitos anos, um período, inclusive, muito perigoso; devido à confusão de conceitos, colocamos no poder, tantas vezes, quem faz tudo, menos por nós. E seria um erro não admitir a mudança!


No meio da confusão, de um lado estão os detentores de velhas práticas, já desanimados com essa navalha do tempo matando seus ideais de fazer algo melhor pelo povo, cansados, tornando tudo uma troca por vantagens. Diante disso tudo, até entendemos o quanto é fácil se vender, abaixar a cabeça, ser a situação do que é mais conveniente. De outro, estão os que são movidos pela novidade, prontos para novos passos, não admitem mais do mesmo, não se adequam, estão eles lá batendo de frente com todo rastro de ideologia vazia, querendo quebrar as amarras e fazer mais.
Quando vemos isso de maneira madura, compreendemos o quanto esse processo é natural, ora na própria vida, ora na política, e na arte quando se faz com qualidade. Se opor é importe, construtivo. Mas veja-se que não basta oposição sem responsabilidade, porque assim, quando nos agradarem os amigos, não criticaremos mais e fecharemos os olhos para o erro, de maneira covarde. Restaria, então, a crítica do absurdo, o diálogo pelo que é possível e o enfrentamento do inaceitável. Embora isso tenha mais a ver com caráter que com partido político, idade ou qualquer outra classificação de pessoas, por isso mesmo é perfeitamente comum que uns alcancem essa postura coerente e outros não.

Entretanto, se opor é perigoso quando não vemos dessa forma; diferente do clichê que se diz, seroposição não é sempre mais fácil. É ameaçador todo aquele que ousar, que quiser o nosso lugar, mesmo que isso seja seu direito. Sem a causalidade interna, sem entendermos que uns precisam suplantar outros para que tudo melhore, tudo se tornaria um enfrentamento mesquinho e o fim das intrigas seriam agressões e calúnias baratas, na tentativa de intimidar, de ferir ou do mais dolorido que for.

É triste para o jovem brasileiro abrir o noticiário às sete da manhã e saber que uma jovem vereadora foi assassinada a tiros dentro de um carro, a parte o fato da violência à qual estamos exposto diariamente, o foco é que o caso está sob suspeita de execução, o porquê disso é simplesmente por a moça ter se tornado, de fato, uma representante do povo que nela votava. 

É muito desconfortável para um jovem do Piauí, que abre os portais de notícias para se informar, logo cedo, se deparar com um texto, sem identificação, que se ocupa por cinco parágrafos mal escritos e pessimamente pontuados, em agredir e caluniar um jovem vereador de Parnaíba, sob a prerrogativa de este “querer ser prefeito”, um cargo, que se diga, que é de direito de qualquer cidadão a quem o seu povo confie. O caso, ao que tudo indica, foi motivado pela crítica que o rapaz fez ao governo municipal, por se opor constantemente ao que está errado e pelo nome do vereador realmente representar ameaça, posto que tem obtido apoio. O texto, do qual não sabemos mencionar o autor, que frisa no silêncio do rapaz, viola não só a liberdade de expressão como também o direito de seu uso ilimitado, que um representante do povo tem de fazer. O que parece é que o vereador continuou calado, preferiu trabalhar, mas a agressão gratuita então instaurada ficou alimentando o medo do jovem que no país hoje tenta fazer diferente. Parece-nos que calados estamos errados e, falando, errados estamos. Assim, se opor é muito perigoso, nos expõe violentamente!

O bom de toda a questão é que, da infantilidade, sabemos que crianças não batem muito forte, e do que já é ultrapassado, nada que é muito velho morde mais com a mesma eficiência. Longe destas duas, poderíamos assumir a madura postura apontada pelo citado sociólogo: a de subir nos ombros dos outros e, acima de tudo, permitir que subam nos nossos. Não é fácil ceder, concordar, mas é necessário, uma hora isso se faz de maneira dolorida ou não, principalmente na política, que é dinâmica. Um dia o novo suplanta o que não serve mais e, um momento, as críticas certas encontram seus destinos.

Então, façamos as contas: Quanto custa os ideais de uma vida inteira? Quanto custa a vida de uma mulher jovem? Quanto se paga para limpar o nome de um homem perante sua cidade? Qual o preço da liberdade? É... O tamanho do nosso prejuízo é vergonhoso, quando o colocamos assim: na ponta do lápis. Pergunte aos gregos e troianos o preço da honra, e se engana você se pensar que dois reis, numa guerra, só brigam por Helena! A política sempre foi assim: se ela sai de seu foco, encontra qualquer outra razão. 

O saldo positivo do cálculo é que todos nela não são iguais e que os processos políticos são fortes; mesmo que se nade contra a corrente, eles acontecem. Em silêncio ou não, o que resta é aguardar. A História, por sua vez, vai registrando tudo, para que nem um nem outro se esqueça de que o diferencial marca e que os que fazem barulho sem diferenciação, se projetam por um tempo, mas depois passam.

Teresina, 17 de março de 2018
Erika Melo - (Historiadora pela UESPI. Mestranda em Literatura, Memória e Cultura PPGL- UESPI, Teresina. Professora de História e Filosofia).

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